Quarta-feira, 9 Julho, 2025
Google search engine
InícioOpiniãoOpiniãoTempo de Responsabilidade Política: O Papel do PS na Estabilidade e na...

Tempo de Responsabilidade Política: O Papel do PS na Estabilidade e na sua Própria Renovação

Em democracia, os ciclos eleitorais não marcam o fim da história — são, antes, um novo começo. As eleições legislativas oferecem ao povo a oportunidade de escolher os seus representantes, mas é no período pós-eleitoral que a verdadeira maturidade política se revela: na capacidade dos partidos lerem o momento, dialogarem, cederem quando necessário e colocarem o interesse nacional acima das estratégias partidárias. Portugal vive hoje um desses momentos decisivos.

Num contexto de crescente fragmentação, com o surgimento de novos atores políticos e a perda de centralidade das forças tradicionais, o país enfrenta desafios que exigem sentido de Estado, responsabilidade e coragem política. O Partido Socialista, enquanto partido fundador da democracia portuguesa, carrega uma herança que não pode ser ignorada. Essa herança é feita de conquistas sociais, de compromisso europeu, de reformas estruturais, mas também — e sobretudo — de estabilidade.

A responsabilidade do PS não é apenas histórica. É atual. Mesmo fora do poder, o Partido Socialista não pode limitar-se a uma atitude de rejeição sistemática. Num Parlamento dividido, o bloqueio puro e simples a qualquer tentativa de governação legítima representa um risco sério para o normal funcionamento das instituições e para a confiança dos cidadãos na democracia representativa. Viabilizar um Governo — seja através de uma abstenção estratégica ou de entendimentos pontuais — não é sinal de fraqueza. É sinal de inteligência política. De maturidade democrática. De respeito pela vontade popular e pelo bem-estar dos portugueses. É a diferença entre contribuir para um ciclo de instabilidade ou assumir um papel construtivo e vigilante na defesa da democracia pluralista.

O PS deve estar preparado para desempenhar esse papel. Pode e deve fazer oposição de forma firme, crítica e exigente, mas não pode cair numa lógica de que quanto pior, melhor. O país não pode esperar por um novo ciclo político para começar a resolver problemas urgentes. A crise na habitação, as dificuldades no acesso à saúde, a degradação da escola pública, a perda de poder de compra, os salários que não chegam e as pensões que não acompanham a inflação — nada disto pode ficar em suspenso à espera da próxima maioria absoluta.

Ao mesmo tempo, o PS enfrenta um momento de viragem interna. O resultado das últimas eleições legislativas não é apenas o encerramento de um ciclo político; é também um aviso claro de que existe uma crescente desconexão entre o partido e o seu eleitorado tradicional. É tempo de reflexão. De reencontro com os valores fundadores. O Partido Socialista precisa de se reorganizar, de repensar a forma como está presente na vida política e de se reaproximar das bases sociais e territoriais que sempre sustentaram o seu projeto político. Precisa de ouvir mais: os militantes de base, os autarcas, os jovens desmobilizados, os trabalhadores desencantados, os reformados esquecidos.

A nova realidade política exige novas formas de intervenção. Já não basta a força da memória nem a boa gestão dos assuntos do Estado. É preciso renovar a linguagem, modernizar os meios de contacto, reconstruir a confiança e combater o populismo com políticas concretas e com exemplo cívico. A credibilidade faz-se com coerência, com verdade e com proximidade.

Esta reorganização interna não é incompatível com a responsabilidade institucional. Pelo contrário: deve caminhar lado a lado. O PS deve mostrar que é possível renovar-se sem abdicar do dever de contribuir para a estabilidade do país. Que é possível exercer uma oposição determinada sem comprometer o funcionamento das instituições. Que é possível, em suma, ser socialista com espírito crítico e sentido de Estado.

Ao longo das últimas décadas, o Partido Socialista foi protagonista de períodos cruciais de progresso e estabilidade em Portugal. É legítimo que hoje queira reestruturar-se e preparar-se para novos tempos. Mas essa renovação só será bem-sucedida se vier acompanhada de um compromisso claro com a democracia, com os cidadãos e com o futuro coletivo.

Chegou o momento de fazer escolhas difíceis, mas necessárias. De optar entre o ruído e a substância. Entre a tática imediata e a estratégia duradoura. Entre o curto prazo e a construção do futuro.

O Partido Socialista tem todas as condições para continuar a ser uma força central da democracia portuguesa — se souber ouvir, reformar-se e agir com responsabilidade.

“A oposição não é um estado de alma, é um estado de responsabilidade.”
Francisco Sá Carneiro

Artigos Relacionados
- Advertisment -
Google search engine

Artigos mais populares